O que nos faz escolher um livro entre tantos? E, mais ainda,
indicá-lo? A sugestão de hoje chegou a mim através de um post de uma amiga
leitora para outra pessoa. Um #acaso, uma #coincidência? O título me fisgou: A
ridícula ideia de nunca mais te ver, da espanhola Rosa Monteiro. Não recordo
bem as palavras da minha amiga leitora, mas era algo sobre a vivência do
luto.
Costumo pensar que os livros seguem a minha clínica, os meus impasses, o que é
incógnita no momento. A morte tem sido cada vez mais uma questão. Ou melhor, a
vida daqueles que ficam é o que me toca. Como lidar com a ausência de um amor
que se foi, de pais que não estão mais vivos, de filhos que inverteram a lógica
do tempo?
O título deste livro é de uma potência admirável. Consegue condensar em tão
poucos caracteres a peculiar relação com a morte. Monteiro, recém viúva,
dialoga com o diário da cientista Marie Curie (única mulher a receber dois
prêmios Nobel) após o falecimento de seu esposo. Um diário recheado de detalhes
cotidianos. Ali se vê um processo de tecimento de memória. Queremos lembrar
todos os detalhes daqueles que morreram. É difícil suportar esquecer o ínfimo.
Costuramos memórias porque as palavras fazem a vida. E não é á toa que em
momentos de dor avassaladora, as palavras parecem nos escapar. Como escreve
Monteiro "Falo daquela dor tão grande que nem parece nascer de dentro,
como se você tivesse sido soterrada por uma avalanche. E está tão enterrada
debaixo dessas toneladas de dor pedregosas que não consegue nem falar."
E
este trecho me remetou a uma memória. Lembrei de uma ocasião em que
uma amiga me telefonou. Queria encaminhar uma mãe que havia perdido a filha a
um par de dias. Esta amiga estava angustiada com o silêncio desta mãe. Achava
que algo deveria ser feito, que ela tinha que iniciar a psicoterapia
imediatamente. Acolhi a sua preocupação e lhe disse: calma, ela ainda não
consegue falar.
Cada um tece o luto de uma maneira singular. Mas o encontro causado pelo ínfimo
detalhe que rememora a vida com aquele que morreu tem uma forte capacidade de
arrebatamento. É a marca de chocolate que lembra a saída do cinema. o chinelo
que costumava ficar virado, o cheiro que lembra o afago.
É difícil para eu caracterizar que tipo de livro é este. Mas só posso afirmar
que vale a pena ser lido. É preciso dizer que A ridícula ideia de nunca
mais te ver não deixa de ser um livro sobre o feminino. Escrevo isto, porque
Monteiro também vai colocando em cena as dificuldades de ser uma mulher
cientista. Curie foi atacada de modos bem torpes por ser uma mulher. Mesmo
assim, é a única enterrada no Panteão de Homens Ilustres. Sublinhe-se a palavra
homens. Utilizando hashtags como #culpa, #fazeroquesedeve, #honraraospais,
#ambição traz enunciados que falam dos impasses enfrentados pelas mulheres para
conseguir espaços na vida pública.
Então, só posso dizer...
Fica a dica!